quarta-feira, 17 de setembro de 2014

"Educar com Amor"



O pediatra Mário Cordeiro lançou mais um livro, com o título "Educar com Amor".
Em entrevista ao Observador, transmitiu algumas ideias.

Em seguida publicamos alguns excertos que poderão dar alguma ajuda:


" Porquê este título? O que é Educar com Amor?
Pode parecer redundante, mas se fosse “10 maneiras de educar” poderia soar a receita. E isto não é uma receita. O que defendo é que não há educação sem amor, nem amor sem educação. Educar é dar armas para o percurso de vida das crianças. Além disso, é conseguir que estas percebam que a vida delas não vai gravitar à volta do seu umbigo. Daí a velha máxima que os nossos direitos acabam quando pisamos os direitos dos outros. É uma expressão banalizada, mas tem uma profundidade enorme. Compatibilizar o puzzle dos desejos de sete mil milhões de pessoas é muito complicado. E, por isso, a educação é realmente uma preparação para que a pessoa seja feliz, descubra os seus talentos, seja bem-sucedida a vários níveis e perceba que há limites.

Qual é o peso do afeto quando se educa uma criança?
O amor tem de estar sempre presente. Para que as relações entre pais e filhos sejam saudáveis estas devem ser marcadas pelo amor oblativo, o amor que não se cobra e que existe apenas porque sim. No limite é dizer-se “eu não preciso de ti para nada, mas gosto de estar contigo”. O amor dos pais pelos filhos não tem razão de ser, a não ser o próprio amor. Mas isto não quer dizer que as crianças possam fazer tudo que querem. Calma! E mesmo quando estamos tristes e desiludidos com os nossos filhos, não podemos esquecer que os amamos. Eles têm de saber isso para poderem replicar o comportamento.

Castigar também é sinal de amor?
Claro. Castigar, no fundo, é mostrar à criança que fez mal, avaliar se esta sabia que estava a agir erradamente e, acima de tudo, estabelecer uma pena. Os pais devem agir como juízes ou árbitros. O futebol, como a vida, é um desporto de contacto em que há conflitos de interesses e tem de haver quem estabeleça regras justas — embora também haja regras estúpidas. Como pais temos de castigar os atos, não as pessoas. Um filho nosso é sempre um filho nosso. E ele é sempre querido, o que fez é que pode estar profundamente errado. Ele, como pessoa, não está em julgamento, mas sim a sua ação.

Como é que se distingue uma coisa da outra?
O filho está chateado e atira um livro do pai ou da mãe para o chão. Expressou, assim, a sua raiva e isto é não está bem. O que está errado, a pessoa ou a ação? Se for a criança, digo que ela é estúpida, que é horrível, que não gosto dela; aí a criança sente-se esmagada. Ao invés, devo dizer: “Tu és querida, adoro-te, mas o que fizeste é indecente”. Só depois dou-lhe um castigo. Assim estou a dizer-lhe que ela fez uma coisa má, mas não a estou a atacar enquanto pessoa. Um bom árbitro é aquele que deixa jogar, mas que analisa — há agravantes e atenuantes. O nosso filho continua a ser querido, mas deve ser castigado. O castigo tem de ir apenas na proporção do mal que ele fez.


- Quais os conselhos que dá aos pais no regresso às aulas?
Depende das idades, se é a primeira vez que a criança vai para a escola ou se há mudanças de ciclo. É bom conversar sobre o que vai acontecer, sobretudo quando na primeira classe, e explicar alguns medos: “É natural que não conheças ninguém; que penses que a professora esteja a olhar só para ti; que dos 26 não és obrigado a gostar de todos e que, a pouco e pouco, vais vendo quem tem mais que ver contigo…”. Explicar também que é preciso ser-se organizado e metódico, saber enquadrar todas as tarefas do dia-a-dia nos vários dias.
Outra coisa que é muito importante: a criança pensa que ao ir para a escola, no momento em que entra, já está a ler e a fazer contas, sente-se pressionada. Digo sempre no consultório “a última letra do abecedário geralmente é aprendida em maio, até lá tens muito tempo”. Dar uma semanada também é importante; sugiro dois euros por semana. Implica ser-se responsável: “Trabalhaste uma semana, tens aqui uma semanada. O esforço foi recompensado e o teu poder aquisitivo está na razão direta do teu trabalho”.

- Das férias para as aulas há uma mudança de hábitos muito grande…
Advogo uma semana antes de começar as aulas para retomar os ritmos. Acho que é bom aproveitar esse período para ver os manuais, as mochilas, os horários, para comprar o material… E ir deitando o filho mais cedo. Trata-se de um reset tranquilo — não pode ser instantâneo.


- Quais são os maiores desafios de uma criança quando a aprender?
É encarar, na maior parte das vezes, uma escola nova e habituar-se ao estar na sala de aula. O impulso de levantar e falar é tolerado no jardim-de-infância, mas não ali [aulas da primeira classe]. Por outro lado, trabalhar em grupo, adaptar-se a outros meninos e ao relacionamento com as auxiliares, que é fundamental no meio disto tudo. O pai deve observar tudo e fazer-se sócio da associação de pais para poder intervir e tentar mudar o que se pode mudar, compreender e ajudar onde pode.

- O pai educa, a escola ensina?
Ensina-se e aprende-se de todo o lado, tanto com os pais como na escola. Sempre que há um momento relacional, há uma ocasião de ensino e de aprendizagem. A escola deve ensinar, não apenas a nível académico, mas também social e relacional. O mesmo com os pais. Um não substitui o outro."

Sem comentários: